terça-feira, 21 de julho de 2015

A casa, arquitetura que tem alma.

Olhou para o relógio pendurado na parede amarela da cozinha, confirmou exatas cinco horas da manhã. Se não sair agora corre o risco de perder o voo. Sabe que volta em dez dias, e mesmo assim aproveita ao máximo os últimos minutos em casa. Aquela sensação de refúgio, de quem se encontra no seu próprio lar. Quantas vezes uma cozinha presenciou situação similar? Quando uma pessoa precisa ir, mas tenta a todo custo alongar a permanência. O que conecta o sentimento de lar à arquitetura? Aqui encontramos uma relação tão íntima entre emoção, memória e arquitetura, que muitas vezes de tão silenciosa, é deixada de lado.
Estamos habituados a ver uma casa em construção, dia após dia tomando forma. Muitos já acompanharam o processo de perto, ou de longe. Quando o terreno é preparado, a estrutura vai ficando pronta e logo a forma aparece, aos poucos, a casa vai ganhando vida. E depois de pronta? Uma casa com grandes aberturas envidraçadas, linhas contemporâneas e os mais atuais revestimentos e efeitos de luz, pode ter o suficiente para que a considerem bela. Mas e alma? A arquitetura só é inteira quando se doa por completo para o seu ocupante, quando sente o que o outro sente.


A arquitetura se doa quando abre janelas para o sol da manhã e o convida a entrar, se doa quando impede a entrada de vendavais, ela se dá quando une os habitantes através de espaços de interação, ela se dá quando a circulação possui espaço suficiente para que alguém possa correr, sem esbarrar no canto de algum móvel. A casa se torna guardiã e cúmplice quando testemunha ritos e celebrações. O homem empresta vida para a casa, com suas vozes, gritos, choros e risadas e de tanto que recebe, ela se dá de volta.
Quanto de vida contém ali? Um tênis esquecido na sala, uma revista que foi folheada e descansa sobre a mesa lateral do sofá, o cheiro quente do bolo de fubá no forno, um quadro que não está simétrico porque alguém esbarrou ao passar correndo, uma xícara suja de café repousando sobre a bancada da cozinha. São os detalhes que indicam humanidade. Aquele quadro que você trouxe quando conheceu Estocolmo. A cor que você aplicou na parede da cozinha porque te lembra da infância na casa da avó. As imensas janelas que você exigiu na sala, e te acalmam quando mostram o jardim lá fora. O gradil que te protege. A iluminação, que de tão bem programada favorece a leitura noturna. O sol que entra pela janela da cozinha. A “cara” que essa casa tem de sua, e que te faz lembrar quem você é quando volta depois de uma viagem de dez dias. A arquitetura muda delicadamente a vida do homem quando o lembra de quem ele é.



É função da arquitetura abraçar e proteger o homem, e proteção vai além de dar abrigo. A arquitetura personaliza a volumetria, a decoração, a forma de habitar. A casa adota a história, o contexto e a personalidade.

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